sexta-feira, 30 de outubro de 2009

ÔNUS DA PROVA NO CDC

O art. 333, parágrafo único, do Código de Processo Civil prevê a nulidade de convenção quando: esta recair sobre direito indisponível da parte; ou quando o direito for disponível, e o acordo tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício de seu direito.
A Constituição Federal de 1988 determinou a proteção do consumidor e a elevou a categoria de direito fundamental e princípio a ser obedecido no referente à estabilidade da ordem econômica, cabendo ao Estado promover a defesa do consumidor (arts. 5o , XXXII e 170,V da CF).
O artigo 5o da Constituição Federal ao estabelecer que o Estado deve promover a defesa do consumidor, assegurando ao cidadão essa proteção como um direito fundamental, implicitamente, reconheceu a vulnerabilidade do consumidor na relação de consumo.
Foi, justamente, no princípio da vulnerabilidade do consumidor que o movimento consumerista se baseou para chegar a atual legislação protetora. Este princípio considera o consumidor a parte mais fraca da relação de consumo, uma vez que o consumidor se submete ao poder de quem dispõe o controle sobre bens de produção para satisfazer suas necessidades de consumo. Em outras palavras, o consumidor se submete às condições que lhes são impostas no mercado de consumo.
O CDC veio disciplinar em seis títulos os direitos do consumidor; as infrações penais; a defesa do consumidor em juízo; o sistema nacional de defesa do consumidor, a convenção coletiva de consumo e disposições finais.
O Código cuida em tutelar o consumidor principalmente em razão de sua vulnerabilidade, procurando reequilibrar as relações de consumo, sem ferir o princípio constitucional da isonomia, tratando os desiguais de modo desigual.
Nelson Nery Junior, ao analisar este princípio constitucional, observa que se deve buscar a paridade das partes no processo no seu sentido efetivo, de fato, e não somente a igualdade jurídica formal, uma vez que esta última seria facilmente alcançável com a adoção de regras legais estáticas. E assevera: "Tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, é a substância do princípio da isonomia". Aliás, princípio consagrado por Rui Barbosa.
Para Luiz Antônio Rizzatto o reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor é uma primeira medida de realização da isonomia garantida na Constituição Federal. Pois, o consumidor é a parte fraca da relação jurídica de consumo, e essa fraqueza decorre de dois aspectos: um de ordem técnica e outro de cunho econômico. O de ordem técnica está relacionado aos meios de produção monopolizados pelo fornecedor. É o fornecedor quem escolhe o que, quando e de que maneira produzir. E o consumidor fica com a escolha reduzida, só podendo optar por aquilo que existe e foi oferecido no mercado. Essa oferta é decidida unilateralmente pelo fornecedor, visando seus interesses empresariais, a obtenção de lucro. O segundo aspecto, o econômico, está na maior capacidade econômica que, via de regra, o fornecedor tem em relação ao consumidor.
A defesa dos interesses e direitos do consumidor pode ser exercida individualmente ou a título coletivo ( art. 81), o Código do Consumidor classificou os direitos ou interesses que podem ser defendidos na tutela judicial de acordo com a sua origem.
A produção das provas em casos que envolvam as relações de consumo, além de aplicar as regras pertinentes do CPC, pressupõe a observância de todos os princípios e normas que norteiam o estatuto legal do consumidor, entre eles os princípios da vulnerabilidade do consumidor, sua hipossuficiência, como também as regras de responsabilização do fornecedor.
A responsabilidade objetiva ou do risco em matéria de consumo como regra geral não conduz à automática procedência do pedido do consumidor, uma vez que este não tem que provar a culpa do fornecedor, mas deve provar o nexo de causalidade entre o produto/ serviço, o evento danoso e o dano para constituir seu direito.
Já, o fornecedor em sua defesa para se desonerar de sua responsabilidade deve comprovar uma das excludentes de responsabilidade: a) que não colocou o produto no mercado; b) que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste; c) a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro ( art. 12, § 3o , incisos I,II e III, CDC). No caso de fornecedor de serviços as excludentes de responsabilidade a serem provadas são: a) que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; b) a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro ( art. 14, § 3o , incisos I e II, CDC).
Se na demanda restar constatado pelo juiz a verossimilhança das alegações ou a hipossuficiência do consumidor, aquele decidirá pela inversão do ônus da prova em favor do consumidor que ficará dispensado da comprovação do defeito do produto, da ocorrência do dano e do nexo causal entre o produto/serviço (art. 6, VIII, CDC).
Os consumidores devem ser tratados de forma desigual pelo CDC e pela legislação em geral a fim de que consigam chegar à igualdade real. Nos termos do art. 5o da Constituição Federal, todos são iguais perante a lei, entendendo-se daí que devem os desiguais ser tratados desigualmente na exata medida de suas desigualdades” .
É certo que, os dois pólos da relação de consumo (consumidor/fornecedor) são compostos por partes desiguais em ordem técnica e econômica, visto que o fornecedor possui, via de regra a técnica da produção que vai de acordo com seus interesses e o poder econômico superior ao consumidor. A vulnerabilidade do consumidor é patente, e a sua proteção como uma garantia é uma conseqüência da evolução jurídica pela qual passamos.
Por sua vez, o fornecedor (fabricante, produtor, comerciante, ou prestador de serviços) não fica refém de um sistema protecionista, pois tem sua ampla defesa assegurada, fazendo uso dos instrumentos processuais necessários para sua defesa como os dos artigos 301 e incisos, 265, IV, a, e 267, IV, todos do CPC, entre outros.
A inversão do ônus da prova como um direito básico do consumidor, e as demais normas que o protege, não ofendem de maneira alguma a isonomia das partes. Ao, contrário, é um instrumento processual com vistas a impedir o desequilíbrio da relação jurídica.
A inversão do ônus da prova é um direito conferido ao consumidor para facilitar sua defesa no processo civil e somente neste. A aplicação deste direito fica a critério do juiz quando for verossímil a alegação do consumidor, ou quando este for hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência (art. 6o , VIII, do CDC).
Vale salientar que o CDC só admite a inversão a favor do consumidor, não cabe facilitação da prova para o fornecedor, dada a vulnerabilidade reconhecida do consumidor.
Caberá ao juiz analisar em quais casos há necessidade de não se aplicar as regras do art. 333 e seguintes do CPC para poder inverter o ônus da prova em desfavor do réu.
A regra do ônus da prova insculpida no Código de Processo Civil é rígida. O juiz pode aplicar a inversão do ônus da prova em favor do consumidor desde que preenchidos um dos requisitos esposados no art. 6o , VIII, do CDC com o objetivo de equilibrar a relação processual.
Se o magistrado constatar que estão presentes um dos requisitos para a inversão do ônus da prova, após verificar segundo as regras de experiência que as alegações do autor são verossímeis ou que o consumidor é hipossuficiente inverterá o ônus da prova em favor do consumidor.
A norma em exame estipula que fica à critério do juiz a inversão quando estiver presente qualquer uma das duas alternativas, a verossimilhança “ou” a hipossuficiência. Essas são vistas como pressupostos de admissibilidade da inversão do ônus da prova.
A inversão do ônus da prova como uma modalidade de facilitação da defesa dos direitos do consumidor somente deve ser admitida quando um dos seus requisitos forem satisfeitos, ou seja a verossimilhança das alegações ou a hipossuficiência do consumidor.
No entender de Beatriz Catarina Dias ao tratar de princípio da verossimilhança:
“Por verossimilhança entende-se algo semelhante à verdade. De acordo com esse princípio, no processo civil o juiz deverá se contentar, ante as provas produzidas, em descobrir a verdade aparente.” Ela acrescenta que deve-se ter cuidado para não relativizar demais este princípio, pois “... é indispensável que do processo resulte efetiva aparência de verdade material, sob pena de não ser acolhida a pretensão por insuficiência de prova - o que eqüivale à ausência ou insuficiência de verossimilhança” .
Neste sentido Cecíla Matos aponta a verossimilhança como um patamar na escala do conhecimento. “Não mais se exige do órgão judicial a certeza sobre os fatos, contentando-se com o Código de Defesa do Consumidor com a comprovação do verossímil, que varia conforme o caso concreto”.
A verossimilhança não exige a certeza da verdade, porém deve existir uma aparente verdade demonstrada nas alegações do autor, que uma vez comparadas com as regras de experiência seja capaz de ensejar a inversão.
O outro critério que deve ser analisado pelo juiz para que se possa inverter o ônus da prova é o da hipossuficiência do consumidor o que se traduz em razão da capacidade econômica e técnica do consumidor.
Conforme Cecília Matos a hipossuficiência do consumidor é característica integrante da vulnerabilidade deste. É demonstrada pela diminuição de capacidade do consumidor, não apenas no aspecto econômico, mas no social, de informações, de educação, de participação, de associação, entre outros.

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